A Câmara Municipal de Vitória da Conquista realizou, na noite desta quarta-feira (19), uma Sessão Especial em homenagem ao Dia Nacional da Consciência Negra e de Ação Antirracismo. O encontro marcou a entrega de duas importantes honrarias do calendário municipal: o Troféu Zumbi dos Palmares, concedido a personalidades que atuam na promoção da igualdade racial, e o Troféu Paranauê, destinado a mestres e praticantes da capoeira que contribuem para o fortalecimento dessa expressão cultural na região.

Realizada no plenário e aberta ao público, a cerimônia reuniu lideranças quilombolas, representantes de comunidades de terreiro, mestres, professores e contramestres de capoeira, além de coletivos e organizações do movimento negro - reforçando o caráter plural e comunitário do evento.

Durante a sessão, também foi realizada uma homenagem especial a Elisabeth Ferreira Lopes (Beta), primeira coordenadora municipal de Promoção da Igualdade Racial em Vitória da Conquista, que faleceu no dia 5 de novembro. Considerada referência na luta antirracista e na defesa das comunidades tradicionais, Elisabeth foi lembrada como pioneira e articuladora de políticas públicas fundamentais na cidade.

O vereador Alexandre Xandó (PT), propositor da sessão, destacou a força simbólica da noite e a presença maciça das comunidades envolvidas:

“É importante ocupar esse espaço e mostrar que ele pertence ao povo negro, ao movimento negro e à resistência de Vitória da Conquista. Fiz questão de trazer minha pequena porque reafirmo sempre: sou um homem branco, e a luta antirracista não é só da população negra - embora o protagonismo seja dela. Em uma sociedade racista, não basta não ser racista, é preciso ser antirracista. Quero que minha filha cresça assim, com uma educação que respeite a diversidade, a igualdade e a liberdade. E é esse compromisso que temos buscado honrar nesta Casa.”

A presidenta do Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial, Mariana Aquino, reforçou a importância do legado de Beta Elizabeth: 

“Se hoje eu estou aqui, enquanto mulher negra, política e educadora, é porque fui tocada pelos ensinamentos de Beta Elizabeth. Ela promovia igualdade racial antes mesmo de existirem políticas públicas para isso. Seguimos inspirados pela sua trajetória e determinados a dar continuidade ao seu legado. A luta do povo negro é ampla e precisa permear todos os espaços da sociedade, porque nada de nós sem nós.”

O professor e pesquisador Alberto Bonfim também destacou a relevância histórica da liderança homenageada: “Metade da minha trajetória eu devo a Beta e à obra dela. Eu não seria professor, não seria mestre e não seria doutor se não fosse por tudo o que ela construiu. Beta marcou gerações e foi a força que impulsionou projetos essenciais para o povo negro em Vitória da Conquista. Honrar Beta é reconhecer a dimensão da sua luta e do legado que deixou para esta cidade.”

O vereador Fernando Jacaré (PT) ressaltou o simbolismo da sessão e a continuidade do legado das lideranças negras no município:

“Hoje é um dia de resistência, de luta e de homenagem. O legado de Beta nos atravessa, assim como atravessou gerações que encontraram, na educação e no movimento negro, um caminho de transformação. E é simbólico celebrar tudo isso entregando o Troféu Zumbi dos Palmares e o Troféu Paranauê, que também reafirmam a força da capoeira e da cultura negra em nossa cidade.”

O vereador Dr. Anderson (PCdoB), que conduziu a sessão representando a Mesa Diretora, reforçou a necessidade de fortalecer as ações públicas de promoção da igualdade racial:

“Precisamos manter vivas esta sessão especial e todas as iniciativas em defesa da consciência negra. Mas não podemos ficar só no discurso - é fundamental ocupar espaços e disputar orçamento, porque é a partir dele que conseguiremos garantir políticas públicas reparatórias e realmente transformadoras. Ainda é muito pouco diante das injustiças históricas, mas é nossa responsabilidade seguir firmes, unidos e comprometidos com essa luta.”

Representando a Casa dos Estudantes Quilombolas, Paulo Vitor emocionou o plenário ao relembrar sua convivência com Beta Elizabeth:

“Beta foi uma matriarca dessa cidade. Eu não sou natural de Vitória da Conquista, mas me sinto filho desta terra porque vi, através dela, um povo que luta dia e noite pelos seus direitos. No nosso último encontro, antes de ela ser internada, Beta me disse: ‘Nós não vamos deixar o remo’. É nisso que eu me agarro. As conquistas do povo negro existem porque outros lutaram antes de nós - por isso, não podemos soltar esse remo. A luta é diária, é postura, é resistência.”

Representando a comissão organizadora do Troféu Paranauê, o Mestre Ferrugem (Fernando Bispo) reforçou a importância da honraria para o fortalecimento da capoeira no município:

“O Troféu Paranauê marca a história da capoeira local porque valoriza e reconhece os nossos. A capoeira sempre foi um grito de liberdade e de força, e ver essa arte ocupando cada vez mais esta Casa, com mais voz e mais representatividade, mostra que estamos preparando uma nova geração. Nosso compromisso é deixar um legado ainda maior para os que vêm depois.”

O vereador Márcio de Vivi (PSD) também participou da sessão especial, reforçando a importância das políticas públicas e da valorização das expressões culturais de matriz africana no município.

Premiados – Edição 2025

Troféu Zumbi dos Palmares

A edição homenageou duas personalidades e uma instituição:

• Pe. Zenilton Dias dos Santos (Pe. Monginho)

Reconhecido por sua atuação pastoral junto à juventude negra, incentivo à Pastoral Afro-brasileira, defesa dos direitos humanos e mobilização contra o genocídio da população negra. Doutor em Direito Canônico e pároco da Paróquia Santa Dulce dos Pobres.

• Jime de Souza Sampaio

Professor e pesquisador do IFBA, com forte atuação em projetos de leitura afro-brasileira, ações antirracistas, fortalecimento do Novembro Negro e participação no COMPPIR. Também colaborou voluntariamente com o Pré-Vestibular Quilombola.

• Instituto Quilombola do Território do Sudoeste Baiano

Instituição que articula 14 municípios, 67 quilombos e 50 associações. Atua no mapeamento de comunidades, defesa dos direitos quilombolas e proposição de políticas públicas. Em 2025, teve papel central no reconhecimento do primeiro quilombo urbano de Vitória da Conquista, o Beco de Vó Dola.

Troféu Paranauê

Premiação dedicada à capoeira, com sete categorias:

1. Categoria “Gunga é meu” – Mestre Dendê

Fundador do Centro Educacional Arte e Movimento Capoeira Escola; capoeirista desde 1990; educador, artesão e palestrante.

2. Categoria “Destaque do Ano” – William Cabral dos Santos (Mestrando Tucano)

Instrutor da Rede Municipal; palestrante; articulador do Brincapoeira; membro do CETA.

3. Categoria “Destaque Sudoeste” – Ademir Bispo dos Reis (Professor Aponga)

Líder do Projeto Axé Ginga, com atuação sociocultural ampliada desde 2012.

4. Categoria “Sou Mandingueira” – Marciléia Gomes Moreira (Professora Guerreira)

Fundadora do Projeto Meninos de Guerreira, referência comunitária e supervisada pelo Mestre Acordeon.

5. Categoria “Destaque Sertão Produtivo” – Romário Martins de Oliveira (Contramestre Companheiro)

Fundador do Grupo Esperança Cultural; forte atuação comunitária.

6. Categoria “Destaque Médio Rio de Contas” – Manoel Carlos Brito Chaves (Mestre Tal)

Referência regional; membro da Associação de Capoeira Os Águias; graduado em Educação Física.

7. Categoria “Destaque Médio Sudoeste” – Cristiano Brito (Mestrando Preto)

Fundador do Grupo Filhos da Terra; professor, pesquisador e difusor da tradição da capoeira.

Anuska Meirelles