Câmara Municipal de Vitória da ConquistaAudiência PúblicaNotíciaMárcia Viviane Alexandre Xandó
09/08/2021 22:50:00
A Câmara Municipal de Vitória da Conquista (CMVC) realizou, na noite dessa segunda-feira (09), uma audiência pública virtual para debater os 15 anos da Lei Federal Nº 11.340/2006, popularmente conhecida como a Lei Maria da Penha. A audiência foi proposta pela vereadora Viviane Sampaio (PT). De acordo com a lei, “configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”.
A audiência foi transmitida pelos canais da Câmara. Você confere aqui a transmissão: https://www.youtube.com/watch?v=u3aRKvbsSZo&t=2049s
Viviane afirmou que mais que comemorar os 15 anos da lei, o objetivo da audiência foi discutir a efetividade da rede conquistense de proteção, combate e prevenção a todas as formas de violência contra a mulher. Para ela, houve avanços no enfrentamento do problema, “mas temos muitos desafios”. Sampaio agradeceu a contribuição do Fórum de Mulheres de Vitória da Conquista na construção da audiência.
A vereadora falou da importância de ações educativas para prevenir a violência de gênero e destacou o Projeto de Lei Nº 87/2021, de sua autoria, que propõe a inclusão, em caráter complementar, no currículo da rede municipal de educação o ensino sobre noções básicas da Lei Maria da Penha. O projeto define ainda o "Agosto Lilás", mês de conscientização pelo fim da violência contra a mulher no município.
Ao final da audiência foi exibido um vídeo com depoimento de Keila Souto, mãe da dentista Ana Luiza, vítima de feminicídio em março deste ano.
Participaram da audiência o vereador Alexandre Xandó (PT), Dayana Evelinne dos Santos Araújo, coordenadora Municipal de Políticas para as Mulheres, Anne Costa, psicóloga do CAAV – Centro de Apoio e Atenção à Vida, Gabriela Diego Garrido, delegada na Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam), Luciana Silva, advogada, professora universitária e coordenadora da Clínica de Direitos Humanos da Uesb, e Lídia Rodrigues, presidenta da União de Mulheres de Vitória da Conquista.
Número de mulheres na política ainda é pequeno – O vereador Alexandre Xandó (PT) parabenizou a colega Viviane pela iniciativa. Ele lamentou a baixa representatividade política feminina na Casa – apenas duas vereadoras num universo de 21 cadeiras. “Ainda temos uma Câmara extremamente machista”, falou. Xandó explicou que seu mandato defende a pauta das mulheres, mas entende que é necessário ampliar a participação delas no Legislativo para avançar nessas bandeiras. “A gente sabe que a linha de frente é das mulheres”, disse o vereador. Ele avalia que o principal papel no combate à violência de gênero é das instituições e reconheceu que a Lei Maria da Penha só foi aprovada diante de pressão da sociedade.
Gestão municipal está engajada – Dayana Evelinne dos Santos Araújo, coordenadora municipal de Políticas para as Mulheres, afirmou que a prefeitura está compromissada com a problemática e reconheceu os desafios. A coordenadora apresentou dados de atendimento do Centro de Referência da Mulher Albertina Vasconcelos (Crav), entre os anos 2017 e 2021. O órgão atende mulheres vítimas de violência e viu os números diminuírem em 2020, em plena pandemia de Covid-19. Dayana avalia que a violência não regrediu, mas em decorrência do isolamento muitas mulheres não conseguiram ou foram impedidas de acessar o serviço.
Em sua fala, a coordenadora explicou que o Crav realiza acolhimento com assistente social e encaminhamento de mulheres para atendimento especializado, como psicólogo ou apoio jurídico. O intuito é fortalecer a vítima para que o ciclo de violência seja rompido. Além disso, promove ações e campanhas educativas como o Março Mulher e o Agosto Lilás. Durante a pandemia, o Crav implantou um canal de atendimento via WhatApp.
Tipos de violência ainda são desconhecidos – A psicóloga Anne Costa, do Caav – Centro de Apoio e Atenção à Vida, explicou que o centro atende mulheres encaminhadas por outros órgãos e também por demanda espontânea, por meio de uma equipe multidisciplinar que conta com profissionais de psicologia, enfermagem, ginecologia e assistência social. Anne alertou que as mulheres ainda enfrentam falta de conhecimento sobre prevenção, o próprio corpo, tipos de violência e “tabus” como o uso do preservativo. A psicóloga falou que dentro dos relacionamentos muitas mulheres não conseguem negociar o uso da proteção e acabem sendo expostas a vários riscos. Outras estão expostas a violências sem ter consciência da situação porque agressões a mulheres ainda são naturalizadas.
Para a profissional, a melhor abordagem é o diálogo para que a mulher atendida se conscientize da própria condição e consiga se libertar da situação de violência. Ela ainda frisou que é importante realizar ações educativas junto ao público de jovens e adolescentes para debater sobre temas como educação sexual, cuidados com o próprio corpo e consentimento.
Com a lei, violência de gênero ganhou visibilidade legal – A delegada Gabriela Diego Garrido, da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam), afirmou que a Lei Maria da Penha é importante porque trouxe visibilidade jurisdicional à violência contra a mulher. “Nós tiramos essa violência contra a mulher das mesas de transação penal e colocamos essa violência no status de inquérito policial, onde a pessoa [agressor] passa a ter uma ficha criminal, onde a pessoa pode ser presa, o que não acontecia antes”, afirmou.
A delegada falou de avanços na lei como a tipificação das violências psicológica e política. Gabriela frisou que a sociedade precisa rever conceitos para avançar na luta contra a violência de gênero e destacou que Conquista conta com movimentos históricos de defesa das mulheres e de uma rede de proteção consistente que ganhará um reforço. Está em curso a implantação de um núcleo de atendimento que vai reunir, num mesmo lugar, a Deam, médico para exame de corpo de delito, a Ronda Maria da Penha e, possivelmente, um preposto do Crav. A delegada reafirmou que ações educativas devem ser prioridade, especialmente em escolas para fortalecer a autoestima das meninas desde a infância. Segundo Gabriela, as mulheres devem “ser donas e protagonistas das próprias vidas”.
Debate sobre gênero é fundamental – A Dra. Luciana Silva, advogada, professora universitária e coordenadora da Clínica de Direitos Humanos da Uesb afirmou que a Lei Maria da Penha deve ser festejada pelos seus 15 anos e também devem ocorrer cobranças para a sua efetividade. Ela explicou que a clínica atua no combate à violação de direitos humanos e um braço do trabalho são ações de enfrentamento à violência de gênero. Segundo Luciana, a prática na clínica propicia aos alunos envolvidos vivências que vão além da técnica jurídica. Para ela, serão profissionais que não aceitarão desigualdades entre homens e mulheres. A clínica realiza pesquisas sobre violações de direitos, ministra palestras e intervenções para o restabelecimento de direitos.
Para Luciana, é necessário estimular nas escolas o debate sobre gênero e o combate a discursos racistas, machistas, capacitistas e etaristas. Ela lamentou que esse debate seja confundido com política partidária, quando o foco é desconstruir o lugar reservado às mulheres historicamente, um espaço simbólico e de inferiorização em relação aos homens.
Lei vai além do caráter punitivista – Lídia Rodrigues, presidenta da União de Mulheres de Vitória da Conquista, falou de situações diversas de violência por que passam as mulheres. Para ela, a naturalização da violência de gênero não pode levar à crença de agressores, muitas vezes, não reconheçam seus atos como criminosos. Lídia lembrou que o sentimento de impunidade é motor de agressões.
A militante frisou que a Lei Maria da Penha tipifica os crimes, mas também prevê uma série de políticas públicas para a prevenção. Para ela, é fundamental ir além do caráter punitivista e realizar ações para a prevenção da violência. A salvaguarda da vida das mulheres é o objetivo do movimento de mulheres, destacou Lídia. Ela acredita que se a lei estivesse sendo aplicada de forma efetiva, o panorama da violência de gênero no país seria outro.